* This text has an English version at the end. Este texto possui uma versão em inglês no final.
Estou certa que dentro da nossa fé em Orixá trouxemos com a gente o modelo da fé cristã. Não há responsáveis, aprendemos culturalmente como se Orixá fosse o nosso Anjo da Guarda e estivesse aqui, sempre de prontidão, em todos os momentos, seja na alegria ou na dor.
Mas quando algo de ruim nos acontece, em algum momento vamos perguntar: Onde estava Orixá que permitiu que isso acontecesse? Você diz:
Eu fui para as obrigações, trabalhei, não faltei uma vez sequer...
É assim que cresce o sentimento de tristeza, da revolta, da descrença e às vezes até a perda da fé.
Tirando no momento do encontro mensal, quinzenal ou semanal… quais outros momentos os Orixás fazem parte da sua vida? Sinceramente! Além da hora do sufoco né, que não conta.
Tenho aprendido a ser devota e digna de ter Orixá ao meu lado, e é sim uma grande lição. Tive que durante anos desconstruir que esse modelo cristão tão enraizado em nós, não se aplica.
Hoje não tenho dúvida nenhuma que É a fé que nos conecta aos Orixás e que isso ocorre de dentro pra fora, é individual e íntimo, e acontece com experiências sensoriais que as palavras não bastam e que a explicação não convence. A fé é o ingrediente mais importante, mas a devoção precisa caminhar junto com a filosofia e o axé adquirido.
Só que da mesma forma de que quando nos apaixonamos por alguém e queremos saber absolutamente tudo sobre aquela pessoa e vamos em busca de conhecê-la, eu fui em busca de saber o que de fato era Orixá.
Foi aí que a busca por um olhar mais crítico, ao encontro do máximo do que pude (e continuo) de conhecimento oral e escrito acabou me desequilibrando. Como assim, né? E que de repente cheguei a um certo nível de ceticismo teórico de tantas coisas mal explicadas e quase me perdi. As informações são muito contraditórias em sua maioria e o certo pode ser certo apenas em alguns lugares e funcionar apenas com algumas pessoas. Eu já não sabia mais qual era a direção a seguir e passei a observar mais os sinais para enfim me reencontrar. E eles vieram sutilmente, de uma maneira leve e nada paranormal.
Me achei, mas me achei como alguém que se descobre indestrutível, dona se sua vida de forma plena e equilibrada. Equilibrada como as cores das folhas sobrepostas, das frutas de cores vibrantes, do mar infinito aos nossos olhos e do céu, que só Eledunmare consegue combinar com tanta maestria. E isso tudo aconteceu como uma virada de chave, que eu acredito que Orunmilá trouxe até o meu Ori e expandiu a minha percepção sobre o mundo espiritual a qual me esforço para pertencer e ser digna diariamente. E esse caminho é possível para todos que de fato querem. Os Orixás, Divindades e Ancestralidade não escolhem prediletos, dentro daqueles que se comportam dentro do esperado,essas são frases que saem da boca da vaidade e não da verdade. Sabe por que? Porque ninguém é capaz de medir espiritualidade com os olhos. Alguns apenas falam demais, outros apenas observam e vivem a espiritualidade como modo de vida e não há necessidade de provar nada a ninguém.
Ser um devoto de Orixá genuíno não é simples. Exige além da fé, o compromisso, o respeito (com o seu Ori e de todos os outros), a disciplina, a ordem, a devoção e conseguir identificar cada segundo do dia o momento que será necessário invocar Orixá para que ele de fato participe da sua vida.
Coube na minha vida e rogo para que caiba na sua o que vou te contar, pensa comigo:
Do que adianta ser iniciado e/ou devoto de Exú e estar sempre paciente nos momentos que a vida não está te exigindo paciência? A gente tem que ser iniciado em Exú na hora que você leva uma fechada no trânsito, quando aquele chato do trabalho não para de falar asneira ou quando a moça do call center te liga às 7h da manhã do sábado, perguntando se você quer adquirir o cartão do banco black premium diamante, que você já disse 30147 vezes que não quer. Ela está fazendo o trabalho dela. É nessas horas que colocamos a nossa devoção em Exú em prática. Ser paciente quando está tudo calmo é muito fácil.
Mais uma:
Outro dia eu acordei de péssimo humor, o que não é normal. Eu não tinha dormido bem, apenas isso. Uma das minhas filhas veio toda cheia de amor para me dar bom dia e eu fui indiferente. Na mesma hora eu pensei: Meleca! Se eu sou uma devota de Oxum, preciso ser boa filha e boa mãe. Fui até o igba de Oxum e a invoquei, rezei um adura e pedi a ela que me ajudasse a ser uma mãe melhor e a saber ter o controle sobre as minhas emoções. Enquanto eu conversava com Oxum, também me veio na cabeça, como um recado que ser mãe não é ser boazinha ou permissiva o tempo todo, que eu preciso preparar minhas filhas para o mundo, mas que eu devia ter autocontrole e nunca, jamais negar amor. No mesmo dia eu fiz uma comida para Oxum, ofertei Obi e Orogbo e agradeci.
Outra:
Há alguns meses eu fiz uma viagem de carro, de um pouco mais de 4 horas. Eu fui até o Igbá e o assentamento de Ogum e Exú e disse a eles que eu ia pegar a estrada, e pedi que eles me levassem e me trouxessem em segurança para meu destino, e que a minha viagem fosse tranquila , além disso também fiz algumas perguntas com Obi e Orogbo quanto a viagem e uma oferenda.
Eu aprendi a invocar, chamar Orixá a qualquer hora do dia ou da noite. O que eu sei em Iorubá, falo em Iorubá, o que eu não sei, vai em português mesmo. Eu agradeço a todos os Orixás MESMO e sempre me emociono, porque eu me sinto ouvida, e tenho certeza que quando preciso, eles estão lá.
O que eu estou querendo dizer é que Orixá não é Anjo da Guarda e que não está a nossa disposição 24hrs por dia, e que para que tenhamos essas divindades sagradas e energias com a gente precisamos despertá-las diariamente ao acordar. A devoção, o zêlo, o cuidado, as conversas são essenciais, a prática do osé que no Brasil se faz mensalmente, mas na Nigéria se faz em um ciclo de 4 dias, e que eu adaptei a minha rotina para fazer semanalmente. Pra quê? Para ter mais contato com a energia. Para poder receber axé. E mesmo quando eu estou morrendo de preguiça, eu faço assim mesmo, porque é o meu compromisso com Orixá. É necessário uma troca de energia constante. Não tem o igbá com você? Invoca no tempo, na terra… no vento, no sol cálido ou no sol do meio dia de Obaluaiê, que seja no silêncio… Mas não deixe Orixá lá no seu Terreiro/Ilê/Egbé , falando com ele apenas uma vez por mês.
Orixá é uma energia divina (ou como queira chamar) que você precisa honrar o axé que você recebeu e cultua. É necessário levá-los para a sua rotina, viver Orixá e ver Orixá em tudo e sempre ter o controle emocional do que é o coerente para qualquer situação dentro da nossa filosofia.
Usar casa de Orixá como pronto-socorro/emergência de hospital pode até resolver um problema momentâneo, mas jamais vai prosperar uma existência.
Ọnà 're - (Um bom caminho para você)
IfáṢọlà Sówùnmí - Fernângeli Aguiar
Fontes Orais
Bàbálórìsà Ifáseun Sówùnmí - Fernando Aguiar - Sacerdote do Templo de Orixás Egbé Áiyé
Bàbálórìsà Adesiná Síkírù Sàlámì - Babá King - Sacerdote do Oduduwa Templo dos Orixás.
Imagem: Adedoyin e Oladunni Olosun, a sacerdotisa-chefe do santuário de Osun (Oshun) no estado de Oshun. Essas fotos foram tiradas no Festival de Shango em 27 de agosto de 2011. Sua linda roupa de renda bordada vermelha é em homenagem a Shango.
Uso da foto autorizada por Olayiwola Olosun Babatunde
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English version
How I brought Orisha to my day to day
I am sure that within our faith in Orisha we have brought with us the model of the Christian faith. There are no responsible people, we learn culturally that Orisha was like our Guardian Angel and was here, always in readiness, at all times, whether in joy or in pain.
But when something bad happens to us, at some point we will ask: Where was Orisha that allowed this to happen? You say:
I went to the bonds, I worked, I did not miss one time ...
This is how the feeling of sadness, of revolt, of disbelief and sometimes even the loss of faith grows.
Taking in the moment of the monthly, biweekly or weekly meeting ... what other moments the Orishas are part of your life? Sincerely! Beyond the time of suffocation, that does not count.
I have learned to be devout and worthy of having Orisha by my side, and it is a great lesson indeed. I had to deconstruct in many years that Christian model so deeply rooted in us, its does not apply.
Today I have no doubt that it is the faith that connects us to the Orisha and that this occurs from the inside out, is individual and intimate, and happens with sensory experiences that words are not enough and that explanation does not convince. Faith is the most important ingredient, but devotion must go along with philosophy and acquired ashe.
Just as in the same way that when we fall in love with someone and want to know absolutely everything about that person and we go in search of knowing it, I went in search of knowing what in fact Orisha was.
It was there that the search for a more critical look, to the maximum encounter of what I could (and continue) of oral and written knowledge ended up unbalancing me. What do you mean, right? And that suddenly I came to a certain level of theoretical skepticism of so many ill-explained things and I almost got lost. The information is very contradictory in its majority and the right one can be certain only in some places and only work with some people. I no longer knew the direction to follow and I began to observe the signs more in order to finally find myself again. And they came subtly, in a light and not paranormal manner.
I found myself, but I found myself as someone who finds himself indestructible, owns his life in a full and balanced way. Balanced as the colors of the overlapping leaves, the fruits of vibrant colors, the infinite sea in our eyes and the sky, which only Eledunmare can combine with such mastery. And it all happened as a key turn, which I believe Orunmila brought back to my Ori and expanded my awareness of the spiritual world which I strive to belong to and to be dignified on a daily basis. And this path is possible for all who really want. The Orishas, Deities and Ancestry do not choose favorites, within those who behave in the expected, these are phrases that come out of the mouth of vanity and not truth. Do you know why? Because no one is able to measure spirituality with their eyes. Some just talk too much, others just observe and live spirituality as a way of life and there is no need to prove anything to anyone.
Being a genuine devotee of Orisha is not simple. It demands beyond faith, commitment, respect (with its Ori and all others), discipline, order, devotion and be able to identify every second of the day the moment that will need to invoke Orisha so that he actually participate of your life.
It was in my life and I ask you to take what I tell you, think to me:
What is the use of being initiated and / or devotee of Eshu and always be patient in moments when life is not demanding patience? We have to get started in Eshu at the time you get a traffic jam, when that boring job does not stop babbling or when the call center girl calls you at 7am on Saturday, asking if you want to get the black diamond bank premium card, you have said 30147 times you do not want. Is not her fault,she's doing her job. It is during these hours that we put our devotion in Eshu into practice. Being patient when everything is calm is very easy.
One more:
The other day I woke up in a bad mood, which is not normal. I had not slept well, just that. One of my daughters came full of love to give me a good day and I was indifferent. At the same time I thought: “Meleca”(Damn it)! If I am a devotee of Oshun, I must be a good daughter and a good mother. I went to the Igba of Oshun and called her, prayed an adura and asked her to help me be a better mother and to have control over my emotions. As I talked to Oshum, it also came to my mind, as a message that being a mother is not being nice or permissive all the time, that I need to prepare my daughters for the world, but that I should have self-control and never, ever deny love . On the same day I made a meal for Oshun, offered Obi and Orogbo and thanked her.
Other:
A few months ago I took a car trip, a little over 4 hours. I went to the Igba and the settlement of Ogun and Eshu and told them that I was going to take the road, and asked them to take me and bring me back safely to my destination, and that my journey would be quiet, some questions with Obi and Orogbo about the trip and an offering.
I learned to call, call Orisha any time of the day or night. What I know in Yoruba, I speak in Yoruba, which I do not know, is in Portuguese. I thank all Orisha EVEN and I always get excited, because I feel heard, and I'm sure that when I need them, they are there.
What I am trying to say is that Orisha is not Guardian Angel and that we are not at our disposal 24hrs a day, and that for us to have these sacred deities and energies with us we must awaken them daily upon awakening. Devotion, zeal, care, conversations are essential, the practice of osé in Brazil is done monthly, but in Nigeria it is done in a 4 day cycle, and that I adapted my routine to do weekly. For what? To have more contact with energy. To be able to receive ashe. And even when I'm dying of laziness, I do anyway, because it's my commitment to Orisha. A constant energy exchange is required. Do not have igbá with you? Call on time, on earth ... in the wind, the warm sun or the midday sun of Obaluaiê, let it be in silence ... But do not leave Orisha there in your / Ile / Egbé and talk to him once a month.
Orisha is a divine energy (or whatever you call it) that you need to honor what you received and worship. It is necessary to take them into your routine, live Orisha and see Orisha in everything and always have the emotional control of what is consistent for any situation within our philosophy.
Using Orisha's house as a hospital emergency room may even solve a momentary problem, but it will never prosper a life.
All this text is based on principles and teachings that I learned in my spiritual family, it is not an absolute concept in Yoruba Lands.
Oral Sources
Bàbálórìsà Ifáseun Sówùnmí - Fernando Aguiar - Priest of the Temple of Orixás Egbé Áiyé
Bàbálórìsà Adesiná Síkírù Sàlámì - Babá King - Priest of the Oduduwa Temple of the Orixás.
Image: Pictured is Adedoyin and Oladunni Olosun, the Chief Priestess of the Osun (Oshun) shrine in Oshun State. These photos were taken at the Shango Festival on August 27, 2011. Their beautiful, red embroidered lace clothing is in honor of Shango. Use of photo authorized by Olayiwola Olosun Babatunde
Ọnà 're - (A good way for you)
IfáṢọlà Sówùnmí - Fernângeli Aguiar