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Ọya / Iansã por todas nós


Foto:  Mark Gellineau

Não há nenhum dos Orixás, em todos os itans, que tenha desistido no primeiro NÃO que a “vida” tenha lhe dado. Todos são guerreiros, e vão em busca de uma solução ou de uma resposta. Nossos Deuses tem uma postura de resiliência, eles são os donos e responsáveis por suas escolhas, jamais vítimas delas. Compreendo que a nossa postura diante da vida também deva ser assim.

Quando se nasce mulher, ganhamos um manual de comportamento, uma lista pré-determinada pela sociedade que nos diz: Seja delicada. Seja elegante. Brinque com bonecas. Esteja linda o dia todo. Seja feminina. Case-se. Limpe uma casa com perfeição. Goste de crianças. Seja mãe. Tenha um corpo de acordo com os padrões de beleza e se esforce para ser jovem para sempre.

Mesmo com o mundo inteiro nos dizendo como devemos nos comportar e que somos fisicamente inferiores, nunca nos faltou CORAGEM para lutar contra isso, e mostrar que o segredo da vida é o equilíbrio.

Não sei qual é o VALOR que você dá às mulheres da sua vida. Eu sou do tipo que observa muito o comportamento dos homens. A minha avó me dizia: “Antes de se casar, observe como o pretendente trata a mãe dele, pois no futuro ele lhe tratará da mesma forma”. Eu acabei adotando isso como padrão para amigos também. Quem fala mal e não trata bem a mãe, avó, irmã, esposa e filhas, não serve para ser meu amigo, pois somos incompatíveis. Radical? Será mesmo?

A gente tem que batalhar muito para conquistar espaço no mercado de trabalho e ter voz ativa nas empresas, além de sermos, socialmente, responsáveis pela casa e pelos filhos. Nossas responsabilidades são sempre diminuídas perante os afazeres masculinos.

Somos ensinadas desde cedo a reprimir o nosso desejo sexual, como se o sexo fosse apenas para os homens. Caso a gente trate sexo, com naturalidade, ou da mesma forma que os homens, seremos rotuladas e vulgarizadas. (Quero mandar aqui o meu salve especial para os seres ”HUMANINHOS” que estabeleceram esse padrão de comportamento). Há quantas gerações lutamos contra tudo isso e muitas outras coisas?

Sou neta de duas mulheres fortes e a frente do seu tempo, que rasgaram os limites impostos pela sociedade. Sou filha de uma mulher especial e única, que me disse durante a infância e adolescência: “Nunca permita que homem nenhum mande em você. Seja dona da sua vida.”

Minhas avós não sabiam, minha mãe não sabe, mas somos todas cultuadoras de Oya (Lê-se Oiá).

Oya, a amada esposa do poderoso Rei Xangô. Mulher e Orixá, com múltiplas faces, que nos diz que é possível ser forte, guerreira, bela, sensual, família e impor limites. Não havia nenhum lugar melhor para Oya estar do que ao lado do Orixá que representa a realeza, o poder e coragem para o Iorubás. Se Xangô tem respeito pela mulher que luta ao lado dele, por que os homens não teriam por suas esposas, mães, irmãs e filhas? Não precisamos estar numa guerra, derramar sangue para que isso seja valorizado, a vida já é uma grande batalha diária. Orixá nos ensina a respeitar a todos e não a desvalorizar ou inferiorizar ninguém.

Eeepa Oya!!!!

Oya é conhecida como Ìyá Onirá - Senhora que reina na cidade de Irá. A palavra ONÍ, em iorubá, exprime algo relativo a posse. Da mesma forma que Ogun é Onire (Senhor da Cidade de Ire), Oya é Onirá. Portanto mesmo que hajam qualidades dentro dos Orixás, a gente acaba descobrindo que TODA Oya é Onirá, pois os itans falam de um único Orixá que tem grande importância em uma determinada cidade.

Há também diversos Itans que falam sobre Oya, a Senhora dos Nove, seja a senhora dos nove oruns, aquela que foi cortada em nove pedaços em sua luta com Ogun ou a mãe de nove filhos, o nome Iansã, é uma propriedade de Oyá no Brasil e na África, por se tratar de Ìyá Mesan, o nome Iansã seria uma corruptela desses dois nomes, pois MESAN = NOVE, em iorubá.

Conhecemos e ouvimos muito falar que Oya foi a esposa preferida de Xangô e o acompanhou em suas batalhas, mas pouco se ouve falar do mito em que Xangô, a proíbe de voltar para Irá, a terra onde estava a sua família. Oya desobedeceu o marido e voltou para a sua família em sua cidade. Quando já estava em casa, soube que Xangô havia fracassado e morrido contra os Nupe em uma guerra. Contam que Oya, chorou de muita tristeza, que nesse dia houve uma grande tempestade, até que a própria Deusa se transformou no Rio Níger.

Tenho aprendido no Culto Tradicional Iorubá que Oya é o Orixá que defende a família e aprecia os devotos que o fazem. Alguns relatos identificam que a iniciação nesse Orixá, de forma íntegra e correta leva o iniciado de volta ao seio familiar, caso tenha se afastado ao longo da vida, assim como proporciona a coragem para a tomada de decisões e a força para impor seus próprios limites.

Mesmo aqueles que não se iniciarão em Iansã, podem cultuá-la para que ela traga esses atributos. Sempre lembrando que Orixá vai te dar armas e ferramentas, mas jamais irá lutar por você.

Para nós mulheres e filhos de Oya, ela é o nosso grito, é aquela que fala à sociedade do valor, da força, do vigor, da coragem, e da luta da mulher. Oyá é o vendaval da vida, líder de movimentos libertadores para a nossa alma. Um Orixá feminino, com a essência dos elementos ar (intelecto) e fogo (força e coragem), a senhora dos ventos e das tempestades, Oyá assim como Obá, representa o PODER FEMININO. Ela diz, como se o vento tivesse voz:

“Não me imponha limites, quem estabelece os meus limites sou eu”

Ire O Ifásolá Egbekemi

Bibliografia: - A Mitologia dos Orixás Africanos - Volume I - Sikiru Salami - Editora Oduduwa

- Iansã - Helena Theodoto - Coleção Orixás - Ed. Pallas

- Site: www.oduduwa.com.br

Imagem:

Imagens 01 e 02 - Mark Gellineau : https://www.flickr.com/photos/eloquator/

O conteúdo do presente texto é uma avaliação e visão particular, baseada na vivência do Candomblé por mais de 20 anos e atualmente no aprendizado dentro do Culto Tradicional Iorubá. Fruto também de estudo e pesquisa de obras nacionais e estrangeiras. Ele não representa nenhuma casa, nenhuma família, nada além de UMA MULHER, brasileira que possui a Alma e o Coração Africanos. Também não tem como intuito ditar novas verdades nem convencer pessoas. Apenas peço que leia com o coração, e fique à vontade para tirar suas próprias conclusões.

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