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Ọ̀sanyìn



Não comecei neste caminho ontem, não sou uma entusiasta e cumpri com todas as etapas que o tempo me cobrou. Já tentaram roubar a vida ao me enganar, e quase perdi a única coisa que me mantinha em pé: a minha fé. Sou uma mulher que começou a brincar pelos terreiros de Candomblé aos 4 anos de idade e vivi a década de 80, 90, 2000… e vivi um pouco de tudo que hoje falam: "no meu tempo…"


Então quando você me vê por aí arrumando confusão na internet, pode ter certeza que será porque eu não sou dessas pessoas que são inertes, se calam e depois reclamam que a Religião está acabando.  


Nos últimos dias recebi de um aluno da Formação de Eerindilogun um direct que dizia assim: "Iniciação de Ọ̀sanyìn no Brasil" com a imagem de um rapaz com menos de 30 anos - acredito eu -, afirmando que ele fazia iniciação de Ọ̀sanyìn - Atenção: - Dentro da Religião Tradicional Yorùbá. A página desse rapaz misturava Quimbanda com RTY. Eu fui até o Instagram do rapaz e disse a ele que ele estava enganando as pessoas, que aquilo era uma mentira, e ele me respondeu com muito deboche, sempre falando de dinheiro, que os filhos dele tinham carro. Eu publiquei todo o embate nos meus stories e isso me rendeu uma ou duas dezenas de outros directs me perguntando: - Por que não se pode iniciar em Ọ̀sanyìn no Esin Orisa Ibile aqui no Brasil?


Portanto, a finalidade deste texto é esclarecer pontos do Culto a Ọ̀sanyìn que são importantes dentro da realidade da Religião Tradicional Yorùbá para conhecimento de nós brasileiros. Sendo assim, não vou focar em escrever um texto rapidinho, vou escrever para que você quase consiga sentir o cheiro da magia de Ọ̀sanyìn. Não me apressarei. Neste texto não irei me referir a NENHUMA outra religião afrodescendente. 


A impressão que tenho é que no Brasil, Ọ̀sanyìn é visto como um velhinho bonzinho e curandeiro. Então vamos primeiro ter uma visão mais lúcida sobre esse Orisa de acordo com a RTY.


No território Yorùbá o culto aos Orisa possui detalhes muito poderosos, que nos obrigam a compreender mais sobre a cultura local com um olhar aborígene e isento de cristandade. Peço que guarde seus valores cristãos por um momento, ou pelo menos não dê ouvido a eles. 


Existe uma divisão importante a ser citada; A primeira são os Orisa funfun, considerados Orisa mais frios, calmos e mais pacíficos, que são comandados por Obatala. A outra divisão trata-se dos Gbígbóná, que são todos os Òrìsà que possuem um temperamento forte e explosivo. São aqueles que possuem temperamento comparado ao poder de destruição e transformação do fogo. Sango, Oya, Ogun, Ija e Obaluaye estão nessa segunda categoria, assim como Ọ̀sanyìn. Quero que comece agora a formar a sua própria imagem de Ọ̀sanyìn, sem influência - neste momento - de saberes que você já trazia.


Há um verso em Obara, no Idaasa, Eerindilogun, que nos ensina o seguinte:


Oni BaraOla BaraAfi igba Ado Oogun ko orunLoruko tan pe Ọ̀sanyìnElese kan sosoTin le elese meji SareEwa wo Ase Ọ̀sanyìnBi tin se.


Este verso conta que Ọ̀sanyìn tem apenas uma perna, mas que ele é muito bom em afastar pessoas que tem duas pernas.

Em algum momento as pessoas passaram a ter inveja do poder e do conhecimento de Ọ̀sanyìn. Passaram a falar mal dele e o zombaram pelo fato dele ter apenas uma perna. Um dia Ọ̀sanyìn se cansou, ficou farto de ser alvo de deboche e ciente de todo o poder e conhecimento que possuía começou a enviar magias para que essas pessoas, para que elas ficassem doentes e/ou atormentadas. Foi assim que as pessoas começaram a ter medo de Ọ̀sanyìn e pararam de insultá-lo. 


Ọ̀sanyìn não é um Orisa pacífico, paz, amor e natureza, ele possui sua própria lei. Alguns seres/divindades/espíritos/Orisa habitam o interior da floresta, entre eles estão Alaragbo, Erinle, Iroko, Oluigbo e Aroni, juntamente com Ọ̀sanyìn. 


A lei de Ọ̀sanyìn é a lei da floresta, sobrevive aquele que for mais inteligente, astuto, mais forte, às vezes o mais rápido, mas com certeza o mais fraco sempre é derrotado. "O animal que se divide em duas cabeças, certamente será devorado"  -  Ou seja, não tenha a cabeça fraca, saiba exatamente o que você busca em sua vida, se fortaleça, para que você não seja engolido pela vida.  - Odù  Obara - Idaasa, Eerindilogun.O universo das magias/medicinas de Ọ̀sanyìn nem sempre são benéficas, e os verdadeiros segredos de quem pratica magia, não combinam nada com os românticos espiritualistas de plantão.  Quem já cresceu sabe que essa é a realidade nua e crua de qualquer universo seja o corporativo religioso, e às vezes até familiar , a vida é mesmo uma selva. A beleza está mesmo na cura, mas a maioria busca apenas por atalhos.No mesmo dia liguei para o meu amigo, o Babalawo Abifarin. Nigeriano, nascido em Ibadan, filho de Babalawo e residente no Brasil há mais de 3 anos. Conversamos um pouco e vou compartilhar com você algumas das informações que ele me revelou:


  1. A grande parte dos Olorisa e Babalawo não gostam de ter o assentamento de Ọ̀sanyìn dentro de casa, nem que seja feito dentro de sua casa, pois Ọ̀sanyìn é conhecido como aquele que faz fofoca, que vira a cabeça de um contra o outro, entre todos da casa, sem parar, até que aquele lar se arruíne, caia. Ọ̀sanyìn conta tudo sem filtro e jamais beneficia/privilegia qualquer parte.  - Podem ficar chocados, pois quando estávamos conversando sobre isso a primeira vez há algumas semanas, eu fiquei pelo menos uns 10 minutos com a boca entreaberta.

  2. Ele também conta que existe um ritual chamado de Ṣíṣẹ́ Ọ̀sanyìn ou Ọ̀sanyìn Ṣíṣẹ́, que se trata do ritual em que a pessoa recebe o assentamento de Ọ̀sanyìn e é autorizada a cultuar aquele Orisa através do assentamento, se aprofundando com o seu mestre nos mistérios e segredos deste Orisa, e que após este ritual, não há iniciação em Ọ̀sanyìn.


Para o Babalawo Abifarin não existe iniciação - Oro Ọ̀sanyìn. É a vivência que ele trás como nascido em terra Yorùbá. No mesmo dia, inquieta, chamo um outro amigo, bem conhecido entre vocês, que é o Bàbá Zarcel. Trocamos algumas mensagens e eu peço a ele a gentileza de escrever algo nesta linha de embate e ele me manda o texto que vou compartilhar na íntegra aqui:ỌsọnyinNo Brasil o Òrìṣà das folhas e até em alguns lugares da terra Yorùbá, mas, na minha família (Ifákáyéjọ) (ABẸ́ÒKÚTA Ògùn State Nigéria) para nós Babaláwo Onífá, Ọsọnyin é um servo de Ọ̀rúnmìlà, um espírito ligado não apenas com as folhas, mas, com tudo que vem da natureza e pode ser transformado em Òògùn (magia, medicina, remédio).


No culto de Ọ̀rúnmìlà, para muitos dos Babaláwo que conversei, principalmente meu mestre Bàbá Ifáníyì, Ọsọnyin não é um Òrìṣà e sim um espírito poderoso que trabalha para Ọ̀rúnmìlà. A função desse espírito é ajudar o Babaláwo a despertar as folhas e demais elementos que compõem uma magia, seja um àkọ̀sẹ̀ Ifá (magia relacionada aos Odù Ifá) ou um Òògùn (medicina que não está vinculada com algum Odù Ifá).


Para nós esse culto não tem uma iniciação.

Além disso, um Babaláwo, para nós, não será um olóòògùn (oníṣègùn). Isso é um tabu em nossa família. (RESPEITO quem aprendeu diferente).


O culto de Ọsọnyin como Òrìṣà, está realmente raro na terra Yorùbá, pois, há muito truque. Mas, poucos olóòògùn (oníṣègùn) sérios mantém esse culto vivo, usando a escultura que fala como pássaro como oráculo para preparar as magias que irão ajudar aos seus consulentes. 


O que é importante dizer, tal processo iniciático nesse culto, requer uma série de elementos e situações que realizar o mesmo fora da terra Yorùbá, sem os especialistas desse culto, é algo ao meu ver, muito complexo.

Ire o


Onífá Elésìrẹ́ Awódélé Zarcel Cohen Carnielli. - Fim do Texto do Bàbá Zarcel.

Ọ̀sanyìn é capaz de transformar o enfermo em sadio, o pobre em rico, o anônimo em famoso, a mulher que tem dificuldades em ter filhos em mãe, ele possui tantas magias que seria impossível de listar aqui. Ele é sim poderoso e é este o ponto que quero chegar.Vendedores (dezenas deles)  de sonhos utópicos, como se o poder e a conexão espiritual do sagrado estivesse apenas nas mãos deles. Um assentamento ou uma iniciação em Ọ̀sanyìn que promete o poder e o conhecimento desse Orisa.

Seria bom se compreendesse que em 2024 estamos num momento delicado da RTY, onde ela caminha rapidamente para ser uma piada de mal gosto, como uma página da história manchada por pessoas que com um mínimo de conhecimento e poder de persuasão, enganam e roubam a sua fé, lhe vendendo poder, fazendo promessas que NUNCA se cumprem. Consegue entender que não é sobre fé ou espiritualidade nem a tal da missão que tantos dizem ter ... é apenas sobre SEDE DE PODER e VAIDADE, nada mais. 


E se existe pessoas assim que enganam, mentem, roubam, extorquem é porque existe quem pague pelo que elas oferecem de praticidade, atalhos e mais uma vez o tal poder abstrato. 


Então quando eu afirmo, que aqui no Brasil, um brasileiro, sem procedência nenhuma, não faz uma iniciação em Ọ̀sanyìn, é porque eu sei exatamente o que estou falando. E mesmo que seja um nigeriano, lembre sobretudo o que eu escrevi acima.


Ọ̀sanyìn é um ser/espírito/orisa complexo, que não tem nada de simples. Duvidem das promessas mirabolantes, lembrem - como já escrevi - o que mais tem nas religiões são manipuladores de mentes e emoções, narcisistas, lobos em pele de cordeiro e mentirosos.


Agradeço imensamente ao Bàbá Zarcel e ao Bàbá Abifarin, por entenderem a minha angústia e me autorizarem a publicar as falas deles. Instagram de ambos. @Casa_Da_ Boa_Sorte @awoifaabifarin Com amor aos Orisa. Iya Ifasola Egbekemi



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