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Sùúrù - Sùru - Paciência

Fê Aguiar

Desde que comecei a estudar o culto tradicional iorubá, passei a me cobrar diariamente a ser uma pessoa melhor, como ser humano, como cultuadora de Orixá, como mãe, profissional, esposa e como filha. É de fato uma guerra, e das mais difíceis. Tornar-se melhor exige disciplina, autoavaliação e reconhecer que a maioria dos nossos problemas não dependem de ninguém além de nós mesmos. Dá até para criar um arquivo na sua cabeça chamado: "Coisas que ninguém pode fazer por você."

Perco lutas e venço batalhas diariamente. Sou testada a todos os momentos e preciso exercitar e me lembrar constantemente ao que me propus a fazer. Senão eu perco o rumo, perco a mão e volto ao zero. Por um segundo, talvez mais, eu penso em desistir, e então lembro do axé e da força no olhar de cada Bàbá e Ìyá africano que conheci, e sei que não dá mais para voltar atrás agora, meu ori não permitiria.

Antes, quando os problemas surgiam, eu pedia ajuda aos Orixás e praticamente entregava tudo nas mãos deles. Hoje, vejo isso apenas como uma crença cega. Em momento algum me preocupava com qual parte do problema era minha responsabilidade. Orixá que era remédio para qualquer tipo de "enfermidade": Problemas no trabalho, coração partido, contas atrasadas, fofoca, auto-estima e por aí vai. Pobrezinha de mim! Que muitas vezes não fui atendida, mesmo com tanta fé. Não, de fato não fui, por que não podemos delegar as nossas responsabilidades.

Quando conheci e comecei a compreender o código de conduta dos iorubás, compreendi que ele não era um código que beneficiava apenas a sociedade, a instituição religiosa e ao próximo para que houvesse ordem no corpo social. Nós, cultuadores de orixá, seríamos os grandes beneficiados. O desafio em seguí-lo seria nos tornarmos pessoas melhores para a nossa vida, e, consequentemente, para os nossos pais, companheiros, filhas e filhos, amigos e para a sociedade.

Não há santidade, e nem pretenção de alcançá-la.

Os princípios iorubanos não incentivam a passividade, mas determinam que sejamos sempre pacientes e tolerantes, inclusive com nós mesmos. A paciência é uma virtude primordial para eles, e é com paciência, que conseguimos conquistar a prosperidade.

Ser paciente é ter domínio sobre as nossas atitudes nos momentos da raiva e da mais profunda tristeza. É não ferir quem amamos simplesmente porque perdemos o controle. Ser paciente, é ser racional no momento certo, é ter serenidade e calma quando uma determinada circustância nos torna cegos diante do mundo. A falta de paciência, nos torna inconsequentes, e consequências não tiram férias.

A falta de paciência também pode nos fazer parecer ingratos com os nossos pais em sua velhice. Sem a paciência não conseguimos ir muito longe, pois nenhum caminho que leva ao sucesso é curto, e para longas caminhadas é preciso calma. Todo caminho próspero exige dedicação, empenho e trabalho. Podem parecer obviedades, mas o óbvio pode naturalmente não ser praticado.

Não importa se você é da geração Z, X ou Y, não importa que estamos em um mundo acelerado, com informações em segundos e pessoas apressadas em alcançar o topo de suas carreiras antes dos 30 anos. A tecnologia nos tornou mimados, assim como nos tornou escravos dela. Entenda; não importa. As regras não vão mudar para a vida. Sem paciência, não se chega a lugar nenhum, e se chegar em algum lugar, não conseguirá ficar por lá muito tempo. Por trás de toda história de sucesso existe paciência e tolerância, mesmo que seja após a chegada.

Sei que ainda estou longe de me tornar alguém paciente, mas eu acredito, mesmo, que esse caminho é capaz de fazer com que os Orixás possam me olhar com orgulho e de fazer com que a vida seja até mais simples, afinal, a gente sente com o coração, intensamente, todas as sensações de viver neste mundo regido pelos orixás e praticado por pessoas.

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