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Ori Sabotador


Quando olho para trás na minha vida e faço uma avaliação de algumas das escolhas que fiz, percebo que algumas pessoas podem até nascer com um mau Ori, o famoso Ori Buruku, mas bons Oris também fazem péssimas escolhas, e acabam tendo dias de mau Ori. A grande questão é que somos governados por nossas decisões e atitudes, e um, apenas um mau passo, é capaz de marcar uma vida toda, independente da idade que você tenha.

Dizem, e eu já li por aí, que quando se nasce com um Ori Buruku, morre-se com ele. Alguns Orixás podem até dar uma ajudinha como Yemoja, Obatalá e Exú, mas eu acredito sim, que deve haver uma chance de um mau Ori transformar-se em bom.

Uma vez, um Caboclo em terra, de uma sabedoria que o homem desconhece, e cujo seu nome é Estrela, me disse : "Está difícil de cuidar de você minha filha. Não adianta dar banho em porco, por que ele gosta é da lama." Queria que alguém tivesse tirado foto da minha cara naquele exato momento. Eu fiquei tão pau da vida e com tanta raiva, que esqueci que se tratava de um caboclo. COMO ASSIM ELE ME CHAMOU DE PORCA??????? Miiiiiiiinha gente, se esse caboclo fosse vivo, eu tinha era chamado ele pra riscar a faca. Eu fiquei muuuuuuuito brava. Eu não tinha entendido nada, mas me senti ofendida e ele tinha me chamado de porca. Poxa vida!

Depois que a fase da raiva passou, que não foi rapidinho, e todas as brumas saíram dos meus olhos, eu consegui finalmente entender o que ele estava me falando. Foi aí que veio a tristeza. Desculpem a palavra, mas na realidade, o que o Caboclo Estrela estava me dizendo era simples: Eu gostava de estar na merda. Não por que eu era louca, mas por que tinha me acostumado a viver no meio da confusão, e não sabia o que era viver em paz. Quando a paz chegava eu a sabotava. Finalmente compreendi que o caos é dinâmico, trás fortes emoções, é movimentado... Já a paz… a paz é monótona para quem não sabe como aproveitá-la. Se meu Ori era Buruku ou não, eu não sei, mas descobri que ele agia como tal.

Eu finalmente tinha entendido que EU, euzinha aqui, não queria paz. Eu me alimentava dos olhares e da atenção das pessoas. Talvez eu gostasse de sofrer e isso é muito bizarro. Meu Ori sempre foi um camarada maneiro, mas era habituado a viver em movimento, um movimento que me deixava estagnada na vida. Hoje me pergunto: Será que era simplesmente o Ori de uma Abiku? Não sei. Mas sei que ser Abiku, nunca poderá ser muleta para todos os meus erros e dificuldades. E mesmo que a minha "abikusisse" colabore, hoje eu sei que é possível lutar, e quando digo lutar eu digo: compreender-se, vigiar-se e policiar-se.

A questão é que eu não queria mais ser porco. Tinha ficado com vergonha, pois depois da raiva, veio a tristeza e por fim a reflexão. A verdadeira reflexão é capaz de reabrir feridas que ignoramos durante anos. A primeira coisa que eu precisava fazer, e talvez a mais difícil, era assumir para mim mesma, que eu era um porco. Que na verdade, enquanto eu gritava para todos que eu não aguentava mais a minha vida, que tudo era difícil, e reclamava que nada dava certo pra mim: A vida passava.

Percebi que todas as vezes que eu encontrava um pouco de paz, meu Ori procurava o caos. Percebi que até as minhas escolhas na vida alimentavam isso. E quando eu digo escolhas feitas pelo Ori podem ser, o marido/esposa que não te dá o amor e a cumplicidade que você precisa e merece, a profissão que não te completa e os amigos problemáticos que te "perseguem".

Tive reacaídas durante o processo, pois na verdade eu não sabia nem por onde começar, puro fogo de palha, até entender que o primeiro passo era o mais importante: Assumir. Assumir que eu era um parasita de mim mesma, e que me alimentava da minha própria desgraça. O segundo passo era enxergar quais eram os momentos em que havia sabotamento, para finalmente começar a vigiar as atitudes e prestar atenção nos pensamentos verdadeiros durante o caos. Eu precisava encontrar a tal voz baixinha e do mal, que devia achar aquilo tudo muito massa! Eu precisava encontrá-la e dizer: Eu não posso me livrar de você da noite para o dia, mas posso vigiar o que você pensa e conversar com você todas as vezes que você se pronunciar. Até que você suma, cale-se ou mude de fato de opinião.

Esses são os inimigos interiores. É contra eles que temos que lutar para que possamos vencer, sem desistir, sem nos entregar facilmente. Somos filhos de grandes Guerreiros e Guerreiras, Reis e Rainhas, e como diz a minha amada Ìyá: Precisamos honrar a realeza que carregamos.

"Quando não há inimigos interiores, os inimigos exteriores

nada podem contra você."

Provérbio africano

*IMAGEM: David Hockney's photos

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