top of page

Por que Ogun Meje?


Encontrar respostas é algo que me enche de um sentimento de alívio. Sabe... tenho uma espécie de medo de ir embora deste mundo sem algumas respostas, por mais que talvez possa encontrá-las depois desta existência, sinto como se tivesse dando check em mais um item da lista imaginária que construí ao longo da minha caminhada no culto aos orixás. Essa lista foi construída a cada um dos vários: "Tudo ao seu tempo" que ouvi.

Eu não quero saber tudo. Até por que sei que uma única existência não é o suficiente. A questão é que quando você ama uma pessoa ou algo, você quer saber absolutamente tudo o que for possível sobre aquela pessoa ou sobre o que te interessa. Qual motivo que nos leva à isso? Cada um tem o seu, e penso que nenhum deve ser julgado. Afinal, todos nós precisamos de algo que nos motive e nos desafie, alguma coisa que torne a vida mais intensa e interessante. Pessoas que não tem isso, normalmente cuidam da vida de outras pessoas.

E vamos a mais uma das minhas histórias.

Estava no Ilê de Ogun. Fui até a casa respirar os ares de Ogun, e um dos responsáveis pela casa estava lá. Fiz minha reverência e então ele começou a saudar Ogun comigo, e ele dizia bem alto: Ogun Meje! Ogun Meje! (Lê-se Medjiê - o som do j é de dj). No fim, eu perguntei o que significava Ogun Meje. Foi aí que ele encheu o pulmão de ar, estufou o peito e respondeu:

- Significa Ogun Sete. - Respondeu com orgulho.

Legal, pensei comigo. E fiquei ali parada olhando para ele, esperando ele continuar. Ele me olhou com um olhar meio sem graça, como quem diz: O que você está esperando? Eu continuei olhando para ele ansiosamente, esperando que ele completasse a resposta. De repente o silêncio entre nós dois ficou incômodo, e rapidamente foi quebrado com uma outra pergunta dele:

- O que mais você quer saber?

- Sete o que? - Eu perguntei olhando para ele com muito interesse.

- Sete, oras...sete é o número de Ogun. - Ele já respondeu meio bravo comigo.

- Mas por quê? - Eu insisti.

- Porque sim ué. É uma qualidade de Ogun. Ele foi dividido em sete pedaços por Oyá.

Fiquei pensando que era muito pouco e vazio. Que me contentei a vida inteira com explicações que não explicavam nada, isso quando eu as tinha. Percebi, que assim como eu, ele também não sabia. Nós apenas repetíamos o que todos diziam sem nenhum critério. Papagaios, é o que éramos.

Não parou por aí. Fui estudar e percebi que muitos itans de Orixás estavam sendo criados. Como se houvesse Ogun na África e Ogum no Brasil. Acredito que afirmar isso é o mesmo que de dizer que qualquer um pode criar a sua própria história sobre Jesus Cristo, por que estamos no Brasil. Ogun é um só, mas grande o suficiente para estar na África, no Brasil, na Eslovênia, na Espanha, em Cuba ou qualquer lugar do mundo. A casa do Orixá é Àiyé. Mas nós seres humanos, somos assim, optamos por inventar uma resposta, ao invés de assumirmos que não sabemos. O problema é que sempre haverá alguém que sabe, que sente, que intui que aquela resposta está sendo inventada, e mais cedo ou mais tarde a verdade aparece. Prefiro ser leiga do que mentirosa. E você o que prefere?

Pode parecer um pequeno detalhe, uma bobagem, uma curiosidade tola, mas não é. Hoje mais do que nunca tenho certeza disso. O culto dos Orixás, tem detalhes bem pequenos que fazem toda diferença na hora de cultuar qualquer Orixá. E não estou falando de fundamento, e sim daquilo que qualquer um deveria saber.

Olhar para trás e ver a minha história e de tantas outras pessoas, que receberam a máxima: "Tudo ao seu Tempo", o tempo todo, para coisas tão simples e necessárias para o culto de Orixá, me faz ter a suspeita de que essa frase muitas vezes escondia uma outra frase que era dita em silêncio: "Eu não sei, e não quero que você saiba que eu não sei. Portanto, vou fazer você sentir-se menor e despreparado para o conhecimento".

A maioria das perguntas são simples. Tem que ser muito vida "loka" para perguntar fundamento litúrgico. Mas uma informação simples? Qual era o problema?

Há alguns poucos meses meu marido, filho de Ogun, me disse que havia descoberto de onde vinha a expressão Meje. Temos por hábito estudar e dividir conhecimento.

Agora, ao cantar qualquer cantiga, que diga Ogun Meje, meu coração consegue aspirar o significado das palavras, e assim, consigo colocar muito mais axé ao cantar. O conhecimento correto é capaz de aumentar a conexão com os Orixás, por que quando as coisas fazem sentido, a razão e a emoção entram em equilíbrio. Comigo super funciona.

Ogun Meje - Ogum das sete personalidades. Para os Iorubás, não está entre as qualidades de Ogun e sim, entre os títulos e epítetos deste Orixá, construídos ao longo de seus vários itans e sua história com milhares de anos.

Vamos agora direto para a fonte bibliográfica e na íntegra do texto do livro Ogum Dor e Júbilo nos rituais de morte. Sikiru Salami/ Prof. King - Editora Oduduwa. Pág 103

"As sete personalidades de Ogum

Guerreiros, caçadores e demais devotos de Ogum, nele reconhecem sete personalidades e por isso, ao cantarem em sua homenagem referem-se a isso dizendo o meu Ogum tem sete personalidades. De fato. Ogum é um só. Porém, devido às sua múltiplas funções, alcançou notoriedade o que se expressa nos nomes que lhe são atribuídos e em cantigas como demostramos a seguir:

Nome

  1. Ogun-onire: Ogum, Rei e Guerreiro da cidade de Ire

  2. Ogun-ikola: Ogum, Homem da navalha que faz circuncisões e marcas faciais

  3. Ogun-Gbenagbena: Ogum, o artesão que trabalha com todas as artes

  4. Ogun-Alagbede : Ogum, o ferreiro

  5. Ogun-Onigbajamo: Ogum, o poeta e historiador, que canta e entoa o ijala e iremoje

  6. Ogun-Olode/Ogun-Makinde : Ogum, guerreiro e caçador

  7. Ogun-Alara: Ogum, o sábio que transforma a terra em riqueza"

Cultuar Orixá, sabendo quem ele é e o que representa, não pode fazer mal a ninguém. Quanto mais estudo e conheço, mais tenho certeza e digo para mim: Tenho orgulho do caminho que escolhi. Agradeço ao meu Ori, por escolher os deuses mais lindos do universos para me acompanhar nessa jornada.

Check!!!

Ògún Yè, mo yè! (Ogum está vivo, eu estou vivo)

Ire O

Ifásolá

Bibliografia Ogum - Dor e Júbilo nos rituais de morte. Sikiru Salami/ Prof. King Editora Oduduwa - 1997

Imagem - Pinterest - Foto sem artista. Quem souber, por favor me informe para que eu possa dar os créditos.

5.550 visualizações
bottom of page