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Iyanifa IfáṢọlà Sówùnmí

A Origem do Sofrimento Humano


Era tarde da noite e ela não conseguia dormir. Seu corpo estava exausto, mas a sua mente precisava de respostas. Todos na casa dormiam e ela esperava que a resposta viesse do silêncio da madrugada. Momento em que os corpos dormem e os Oris vagam pelo mundo que não conhecemos, eles passeiam em labirintos com o cheiro de guardado do inconsciente e por tons escuros do subconsciente, mas ambos rodopiam e ganham voz em formas de sonhos. Pra ela não. Era mais uma noite em claro.

Apagou todas as luzes, sentou-se na varanda em uma pequena cadeira de praia e começou a contar as estrelas sem usar os dedos, para não correr o risco de ganhar uma verruga. Enquanto o vento trazia o cheiro forte de chuva e fazia o coqueiro e o bambuzal balançarem, em uma dança frenética sem compasso. O vento parou de repente e com ele o tempo cessou. Foram apenas centésimos de segundos, para que um grito fino, longo e agudo invadisse a paz do momento em meio as estrelas que tentava contar...

O conhecimento Yorúbà é cheio de labirintos, muitos deles bifurcados que não levam a lugar nenhum e a todos os lugares ao mesmo tempo, às vezes como se fosse um jogo de tabuleiro, daqueles que se você tirar a carta errada, ela pode te fazer voltar ao início.

O que vou escrever hoje não está escrito em lugar nenhum (acredito eu), é baseado em conclusões PESSOAIS sobre um sistema religioso rico, profundo e perigoso para os que possuem vaidade, cegueira e ego inflado. Portanto convido você, que está lendo este texto, a apenas pensar nesta possibilidade, e não de acatá-la como verdade. Apenas pense.

Vou começar com um Itan já divulgado por muitos aqui na internet.

De forma bem resumida, em um dos itan da criação do homem em Àiyé , conta-se que quando as Mães (Ìyámi) vieram ao mundo (há versões diferentes deste mito) e encontraram os seres humanos manipulando uns aos outros, pagando o bem com o mal, traindo seus próprios amigos, matando os seus semelhantes e até seus próprios pais e filhos, sendo ingratos com os que lhe deram um prato de comida ou usando a gratidão para escravizar, enganando aos que tinham bom coração e boa fé, vendo a vaidade e orgulho vencer o amor em busca do poder, roubando os que lhe deram abrigo, brigando pela verdade que não existe, mentindo para os seus próprios filhos, estuprando crianças, desvalorizando a terra que os alimentava... Elas ficaram encolerizadas e voltaram para o Orun. Elas então voltaram para onde Eledumare vivia, e disseram que para Aiye Elas não voltariam, pois Elas viam que a criação de Olorun, os seres humanos, que também eram seus filhos, eram ingratos e estavam condenando uns aos outros ao próprio sofrimento através de suas ações. Eledumare, pediu à Elas que voltassem, e deu as Iyami a missão de EQUILIBRAR Àiyé. Naquele momento as Grandes Mães criaram os ajoguns.

Os Ajoguns são todas as formas do SOFRIMENTO humano:

A maldição A desgraça A perda A doença A morte prematura A dor A tragédia As pragas

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Das piores dores de uma Mãe, é a dor de precisar punir os seus próprios filhos e a de vê-lo sendo punidos. Escrevo isso como mãe que sou. Não há outro caminho para a cura senão pela dor. Ninguém aprende nada através da felicidade. Você já parou para pensar nisso?

O mundo é circular e linear, realidades que se contrapõem e se equilibram num movimento perfeito de ação e reação, de causa e consequência. Todos os dias cometemos erros e acertos, que são exatamente as nossas ações que gerarão reações. Essas reações não necessariamente chegam amanhã, ou depois… na verdade não se sabe quando elas chegarão. Cada ação é como uma semente, cada uma no seu tempo. E aos bondosos de plantão compreendam que a regra do Universo é clara: Uma boa ação, não anula uma errada.

Seria ótimo, sim seria… se apenas nós mesmos pagássemos pelos nossos erros e por nossas escolhas. Assim seria fácil, mas não é assim que funciona.

Em alguns Oriki, Adura de Esu e de Iyami, há um desfecho que chama atenção para a dinâmica de aiye, veja:

Esu/Iyami ma se mi omo elomiran ni o se

Tradução:

Esu/Iyami não me faça mal. Faça mal ao filho do outro.

*Os ajoguns estão nas mãos de Esu e Iyami.

Muito pior do que viver a dor, é ver a dor em nossos filhos e nas pessoas que amamos. (Obviamente essa dor não atinge os psicopatas que não conseguem amar ninguém além deles mesmos, pois ser um deles já é a sua própria dor). A nossa dor conseguimos carregar e muitas vezes suportar. Mas é na dor de um filho que nos sentimos incapazes, inúteis, perdidos e incompetentes.

Quando cometemos erros que encolerizam as grandes mães, ações que desequilibram o Universo, não estamos apenas trazendo as consequências para nós e sim para os nossos descendentes.

É muito, muito comum em minhas consultas com o erindilogun me deparar com problemas de ordem de saúde, espiritual, material e emocional, que não foram geradas pela pessoa que está ali na minha frente consultando, e sim pelos seus pais, pelos avós… e assim por diante. Pessoas muitas vezes desorientadas que não compreendem a origem de suas dores, que não compreendem onde erraram e nem ao menos que erro cometeram. Dependendo da gravidade da ação de origem, as consequências se arrastam de geração em geração, dilacerando famílias inteiras. Não conheci ainda dentro do Culto Tradicional Yoruba (Onde se encontram em perfeita sincronia: Esu, Orunmila/Ifá, Iyami, Egbe Orun, Egungun, Osun, Sango, Oyá, Ogun, Obatalá, Olokun, Aje, Yemoja, Osoosi, Erinle e todos os Orisa) um problema que não tivesse uma resposta trazida com lógica e sabedoria.

Assim vão se unindo peças desse jogo chamado VIVER, alguma chaves de compreensão sobre a vida abrem caminhos em nosso Ori para honrar a nossa existência, e vamos aprendendo que:

  • Quase todo sofrimento humano tem origem em ações do próprio ser humano e somos nós que causamos o desequilíbrio em àiyé.

  • A lei do retorno atinge a nossa descendência

  • Os problemas que temos hoje, podem ser a colheita de uma ação/atitude de muitos anos atrás

  • As reações de nossas atitudes, não têm prazo nem data para acontecerem.

… após o grito agudo que invadiu aquele momento de contar estrelas, rasgando a noite, surge uma epifania recheada de sentimentos que com certeza gerarão novas noites em claro. Mas tudo é gratificante quando se tem a base da sabedoria milenar Yoruba.

Ọ̀nà’ re o - (Um bom caminho para você) Ìyánifá IfáṢọlà Ṣówùnmí

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