A preferência pelos homens como sacerdote
- Fernângeli Aguiar
- 1 de jul.
- 4 min de leitura

Quem rege as suas escolhas?
Quem toma as decisões na sua vida?
Você ou o seu inconsciente?
Mas o ponto é, quantas escolhas na sua vida são suas? Quantas estão condicionadas por um incentivo externo ou inconsciente coletivo? A realidade? Ninguém sabe.
Vou agora provar para você que inconscientemente você carrega uma tendência avassaladora de preferir homens para as funções profissionais, de ensino e até de sacerdócio e orientação.
A predominância masculina tem origem em sociedades patriarcais antigas. O androcentrismo e o falocentrismo moldaram as estruturas religiosas ao colocar o homem como padrão ideal de liderança, o que marginalizou as mulheres. Estudiosos criticam essa visão, apontando que a exclusão feminina no sacerdócio é fruto de construções sociais, não de fundamentos teológicos.
Na casa tradicional, o pai é o cabeça, a mãe é o coração. A autoridade é do pai. O afeto, da mãe. Essa dualidade hierárquica e simbólica é projetada nas instituições. Se espera que o pai discipline, oriente, proteja e seja a “ponte com o mundo exterior". O sacerdote é visto como aquele que tem autoridade diante do invisível. É ele quem fala com os deuses, dá a última palavra. A mulher – mesmo quando espiritualizada – é vista como cuidadora, intercessora, mediadora suave, mas não como porta-voz de comando. As mulheres que conseguem chegar em posições de liderança muitas vezes acabam precisando esconder os sentimentos e sua sensibilidade e até mesmo se masculinizar para conseguirem ser ouvidas.
Desde a infância, muitas pessoas crescem com uma imagem de Deus como um pai: Pai Nosso, Pai Celestial, Bàbá, Olódùmarè – todos com gênero masculino. E quando essa imagem é solidificada, espera-se que aquele que representa o sagrado na Terra também tenha forma masculina.
Essa projeção é emocional. O sacerdote é, simbolicamente, o “papai espiritual”. Desafiá-la exige maturidade psíquica e crítica religiosa, duas coisas que nem todas as comunidades incentivam.
Quando uma mulher ocupa um papel de sacerdócio, ela confronta essa estrutura. Ela deixa o espaço do afeto para ocupar o lugar da autoridade. E isso, em sociedades moldadas pelo patriarcado, é visto como desconfortável ou até ameaçador.
"Uma mulher no comando espiritual? Mas ela é emocional demais."
"Será que ela não está misturando seus sentimentos com a liderança?"
"Ela tem conhecimento mesmo, ou só tem fé?" Essas frases revelam uma sombra perdida dentro de você, que coloca o saber racional (associado ao masculino) acima do saber sensível (associado ao feminino).
Quando a mulher ocupa o lugar de liderança espiritual, ela subverte a casa e o templo. Ela mostra que autoridade e acolhimento não são polos opostos. Que o cuidado pode ter voz firme. Que a sabedoria não precisa vir vestida de austeridade masculina. Mas para que isso aconteça de maneira legítima, a sociedade precisa reaprender o papel do sagrado. O sagrado que amamenta, que sangra, que acolhe, mas também que interdita, conduz e transforma.
A maioria de nós vivenciou uma paternidade ausente, sempre em busca de dinheiro e do tal sustento, o homem como o provedor. Quando a mulher é a provedora da casa, isso também gera um incômodo. Mais uma vez, quem é capaz de abençoar com prosperidade financeira? O homem certamente. Um tema de suma importância, numa comunidade que visa a produtividade e não o afeto. E por que não ambos? Por que você simplesmente nunca parou para pensar que você está quase sempre sendo manipulado pelo seu inconsciente e o coletivo.
Durante muito tempo, observei em silêncio como a figura masculina ocupa com tanta naturalidade o lugar do sacerdote. As pessoas confiam mais. Escutam mais. Dão mais crédito. E isso não é inveja — é constatação - já que com certeza alguém dirá que é dor de cotovelo, mas é só mais uma de tantas reflexões que gosto de provocar.
Fui entendendo, com o tempo, que essa preferência não nasce apenas da religião. Ela nasce em casa, na história e até mesmo na figura sensível demais, incapaz, burra, fútil, fraca que a mídia vendeu para todos nós como adjetivos da mulher. A mulher que vive também em função da aparência.
É curioso... Nunca vi ninguém perguntar se um homem está emocional demais para ser sacerdote.
Mas eu entendo. Entendo porque a sociedade foi construída assim. Entendo porque Deus foi apresentado a você como homem. Entendo porque o sagrado foi domesticado por símbolos de força, guerra e comando — todos atributos masculinizados.
Pra mim, o unilateral de uma dualidade é manca.
Mesmo assim, escolhi permanecer aqui.
Porque a mulher também é casa.
Ela é fundação, é teto e é chão.
Ela também fala com o invisível, carrega silêncio, entende mistério.
Ela também impõe limites, aponta caminhos e sustenta a fé de muitos.
O útero é um espaço sagrado.
A menstruação, uma renovação cíclica.
O parto, uma iniciação.
A escuta atenta, um oráculo.
Não estamos no sacerdócio para provar algo.
Não pedimos aceitação.
Afirmamos presença.
Eu entendo o desconforto.
Se acostumar a ver apenas um tipo de líder espiritual cria cegueira simbólica. Mas esse incômodo… não é meu. É do reflexo antigo que começa a rachar.
O sagrado também sabe se vestir de mulher.
E quando o faz, não enfraquece.
Ele simplesmente revela o que faltava: a outra metade da divindade que muitos ainda se recusam a ver.
Não pedimos aceitação.
Peço apenas que reparem: O sagrado também sabe se vestir de mulher.
Ona're O
Um bom caminho para você.
Iya Ifasola Egbekemi
Ile Obatala Oni Igba Iwa - Brasília DF
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Incrível texto. O sagrado também sabe se vestir de mulher. Axé!!!